Uma lembrança.
Era uma pequena confraternização familiar.
Meu tio Sebastião corria de um lado para o outro com sua câmera nova - como uma criança que procura todas as formas de usar o seu novo brinquedo. Todos tinham suas histórias para contar e, em parte, os jovens só escutavam os mais velhos. Eu, por isso, permanecia calado e vagando... E as lembranças que as vozes revelavam pareciam maiores, grandes colossos que o tempo construiu na nossa história, na chama eterna da memória - dentro de cada um, no mesmo lugar em que adormece as esperanças para o futuro.
E foi na mágica da introspecção que me encontrei, verdadeiro. Ocorreu-me uma história antiga e linda que já tinha deixado, quase totalmente, ser levada com o tempo. Foi nesse momento que uma lágrima pendeu do meu rosto direto para o chão, onde permaneceu quieta e viva para sempre.
Um Monza vinho, os três primos no banco traseiro, nenhum com mais de sete anos, Sebastião dirigindo. Observávamos a cidade correr do lado de fora do veículo, a brisa intensa fazia cócegas em nossos rostos e balançava os cabelos. No céu, todas as cores, muita vida, um dia que terminava calmamente.
- Vou contar uma coisa para vocês... – meu tio, com uma paz tremenda na voz, parecia saber o mais legal de todos os segredos. - quando o dia está indo embora, vem anjos e derramam um monte de tinta no céu, até que elas escorrem, misturam-se e formam o azul bem escuro da noite. E quando a gente vai dormir, eles voltam para Terra e desenham os nossos sonhos.
- E os pesadelos, papai? - minha prima perguntou-lhe.
- Às vezes... acaba a tinta das canetinhas e os anjos não tem com o que desenhar, daí a gente sonha essas coisas ruins. Mas, em noites assim, eles acordam as crianças para irem dormir com seus pais e ficarem seguras de novo.
Mil cores no crepúsculo.
Todas refletidas nos nossos olhos úmidos.
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