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terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

Para ler com pressa.

Foto por Bruna Pimenta.


por Stefano Manzolli.

Uma lembrança.

Era uma pequena confraternização familiar.

Meu tio Sebastião corria de um lado para o outro com sua câmera nova - como uma criança que procura todas as formas de usar o seu novo brinquedo. Todos tinham suas histórias para contar e, em parte, os jovens só escutavam os mais velhos. Eu, por isso, permanecia calado e vagando... E as lembranças que as vozes revelavam pareciam maiores, grandes colossos que o tempo construiu na nossa história, na chama eterna da memória - dentro de cada um, no mesmo lugar em que adormece as esperanças para o futuro.

E foi na mágica da introspecção que me encontrei, verdadeiro. Ocorreu-me uma história antiga e linda que já tinha deixado, quase totalmente, ser levada com o tempo. Foi nesse momento que uma lágrima pendeu do meu rosto direto para o chão, onde permaneceu quieta e viva para sempre.

Um Monza vinho, os três primos no banco traseiro, nenhum com mais de sete anos, Sebastião dirigindo. Observávamos a cidade correr do lado de fora do veículo, a brisa intensa fazia cócegas em nossos rostos e balançava os cabelos. No céu, todas as cores, muita vida, um dia que terminava calmamente.

- Vou contar uma coisa para vocês... – meu tio, com uma paz tremenda na voz, parecia saber o mais legal de todos os segredos. - quando o dia está indo embora, vem anjos e derramam um monte de tinta no céu, até que elas escorrem, misturam-se e formam o azul bem escuro da noite. E quando a gente vai dormir, eles voltam para Terra e desenham os nossos sonhos.

- E os pesadelos, papai? - minha prima perguntou-lhe.

- Às vezes... acaba a tinta das canetinhas e os anjos não tem com o que desenhar, daí a gente sonha essas coisas ruins. Mas, em noites assim, eles acordam as crianças para irem dormir com seus pais e ficarem seguras de novo.

Mil cores no crepúsculo.

Todas refletidas nos nossos olhos úmidos.

terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

Para ler com pressa.

Foto por Bruna Pimenta.


NOTTE.


por Stefano Manzolli.


Noite.

Sob o céu estrelado, a cidade se defaz sem pudores.

Primeiro, as formas perdem seus contornos e tornam-se apenas vultos brincando com o escuro, bailando graciosamente com o silêncio. Depois, os loucos retomam a sanidade e começam a profetizar o tempo e, qualquer guarda passando na rua, não perde a oportunidade de aquietá-los à força.

Então, os amantes.

O amor fica cheio de vontade e possuído pelo instinto animalesco - uns vorazes, devoram corpos por entre os lençóis da vida; outros mansos, imaginam-se amando, quietos e deliciosamente.

Nos quartos, nos botecos, nas esquinas, nos palacetes, nos cabarés, a noite faz-se presente trocando sensações por denários de ouro, orgulho por mantos frios de solidão, fragilidades por pileques épicos, vida por pedras ilusórias e cintilantes, realidade por sonhos lindos. A noite é cambista mal-paga, cheirando malandragem: torna o sensato em abstrato e, brincando conosco, faz de conta uma porção de coisas.

Quem era, deixa de ser.

Os meninos sem pais, fustigados e serenos, deitam-se no colo da impunidade.

E os artistas - os poetas, os embriagados de arte, os pintores, os músicos -, todos eles tragam a noite, como cigarro fino: aos poucos, saboreando-a, extraindo os seus melhores fragmentos, as melhores idéias para, depois, compor suas obras-primas. À noite, meus caros, a inspiração sai de casa em casa, procurando quem a adote e faça, a partir dela, a mais pura verdade, a mistura certa entre o literário e o sensato.

Noite.

Janela aberta e os ares noturnos entorpecem a alma - os frágeis deixam-se levar pela bricadeira das estrelas e, num lapso lindo, anoitecem completamente.

Noite.

Mágica que ninguém domestica. Que ninguém desvenda.

Noite, eternamente noite.

domingo, 4 de janeiro de 2009

Para ler com pressa.

Foto por Bruna Pimenta.


PEGADAS.

por Stefano Manzolli.


Corro, mas as pegadas permanecem logo atrás de mim. Não há tempo, distância ou velocidade que possa apagá-las. E o vento? Também não. O vento leva apenas a forma física do buraco na areia, porém a essência permanecerá para sempre.

A respiração está ofegante e os olhos nublam periodicamente... crio, nas imensas paredes rochosas, meus fantasmas de tempestade: a garrafa de uísque no chão, os olhos sombrios e estilhaçados, o corpo taciturno ao pé da escada, a árvore de Natal incendiada pelas luzes pisca-pisca.

Faz tempo que passou o Natal, até já entramos em um novo ano... a árvore, todavia, continuava na sala apenas por preguiça de desmontá-la. Talvez, não sei, era necessário que fosse testemunha - inanimada, velada, solene -, antes de tornar-se fuligem.

Agora, ela aparece um pouco desfigurada entre as fendas das pedras. As lágrimas não são suficientes para levá-la embora. Minha mente, frenética, ainda digere a idéia da fuga... "Não é fuga!" e a voz explode ao colidir com o ar. "Não é fuga!" e há vertigem na frase. "Fuga... fuga... fu...", a repetição amolece a idéia e torna-a mais fácil de ser compreendida... é fuga, quem sabe?

Fuga de mim mesmo, de um futuro que tentei não construir, de um clímax calculado e do épico envolto pelo manto da morte.

Chego à orla da praia. À frente, o mar - turvo, misterioso, entorpecente, convidativo. Atrás, as pegadas - fantasmas, estúpidas, eternas, cacos de vida. Sorrio... irônico da minha situação; chuto uma porção generosa de areia e cada grão reflete o sol - faz tempo que não olho para o céu. Hoje, está sem-graça: não há nuvens, assim como ontem à noite não havia estrelas. Entro na água, a qual engole meus pés... pernas... braços... depois, num momento sublime, percebo-me todo imergido e aprecio a idéia de não saber nadar.

É só uma questão de segundos para romper o meu cordão umbilical com a vida. Como sempre ouvi falar, as lembranças chegam (aos montes) e afundo cada vez mais - na água e na nostalgia. Falta o ar, chega a agonia de saber que não há volta... bato os braças e as pernas descompassadamente, engulo cada vez mais água. Vejo, em flashes, a noite passada e a covardia me empurra para baixo.

Começam os delírios.

Uma sereia, uns familiares, um ídolo da infância... um salva-vidas (um salva-vidas?) - nadando em minha direção, segurando meus braços, colocando minha cabeça para fora das ondas. Uma rajada de ar infla meus pulmões; respiro vagarosamente, sem motivos para voltar à realidade.

Estou vivo... se pudesse, escolheria a morte covarde - não posso mais. Resta-me o inevitável: uma nova chance de enfrentar as pegadas eternas da minha vida.

quinta-feira, 25 de dezembro de 2008

Para ler com pressa.

Foto por Bruna Pimenta.
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por Stefano Manzolli.
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NATAL.
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Depois de um ano quase-inteiro, é natal outra vez. Tem gente que adora, nessa época do ano, olhar para todo o tempo vivido e se convencer que nada valeu a pena. Porém, hoje, façamos diferente: ao analisar o passado, vamos tentar entender que os momentos ruins são como dias nublados... o sol não deixa de raiar, está apenas encoberto - depois de um tempo, com certeza ele irá aparecer. Ou seja, precisamos entender que, para cada pedra, há um salto (uma evolução do que somos) e uma perspectiva nova para encarar o mundo, mesmo que seja difícil enxergá-la em um primeiro momento.
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Por isso, não culpe-se pelos erros, pela pouca fé ou muita tristeza... não culpe-se por nada: acredite que uma magia qualquer de Natal pode apagar as más lembranças e perpetuar as boas. E não importa sua crença, sua origem, entenda que o Natal é tempo para desprender-se dos fardos, alimentar lindas esperanças e renovar a areia da história (para que, daqui oito dias, possamos esboçar outros sonhos nela).
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Ontem, para quem não sabe, foi o Dia Mundial do Perdão. Se você continua bravo com alguém, ainda há tempo de perdoar, pedir desculpas ou esclarecer os pormenores. Só não deixe acumular rancor para o próximo ano, faça desse Natal um momento de reflexão e deseje apenas o bem ao outro, tente ser alegria plena e compartilhe... não perca a oportunidade de ser a pessoa certa, na hora certa.
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Na pior das hipóteses, se nada disso tiver sentido para você, aproveite seu presente de Natal e seja feliz da sua maneira própria.
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Para todos que acompanharam o blog até aqui, um ótimo Natal e muito de tudo que é bom!
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Até outros textos e oportunidades,
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Stefano Manzolli.

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

Para ler com pressa.

Foto por Bruna Pimenta
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por Stefano Manzolli.
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UMA SENSAÇÃO AGUDA E INCOERENTE.
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Sinto um vazio, mas não chega a ser dor, sacrilégio ou desespero... é apenas uma sensação. Dessas que chegam num piscar de olhos e demoram muito tempo para ir embora. Na verdade, sinto-me vazio e, para isso, sei apenas um infalível remédio: sentar, ler um bom livro, cruzar os braços, refletir bastante, deixar que a vida passe ligeiramente e esperar, esperar, esperar.

Antes das teorias e diversas falsas-lógicas, insisto: a única causa para esse tipo de sentimento é a falta. Uma falta sublime, cheia de eco, totalmente oca, à deriva do tempo. Uma falta digna ser nomeada assim. E por ser tão aguda e incoerente, sussurra pelo vento a pior das perguntas: falta de que?

Se ontem mesmo, a vida era tão bonita e deliciável; o tempo passava arrastado e o pensamento ficava lá longe, junto de um corpo amado. Se ontem mesmo, tudo estava tão bom e eu não precisava de nada mais, como posso sentir, agora, falta de alguma coisa? Hum... talvez, não sei, o motivo seja exatamente o contrário: esse vazio só ocorre por eu não sentir falta.

Se tudo está bem, não há muito o que falar, as queixas perdem a graça e os papos ficam relativamente chatos. Quando tudo vai de vento em popa; quando nos abrigamos no reino da perfeição, não resta nada a almejar e o tédio pode ser um grande aliado. A felicidade não é muito compartilhável e nem tão poética como a dor.

(A dor de amar, de perder, de existir).

É pela dor que construímos a verdadeira alegria - castelo de porcelana belo e frágil. Vivemos para fugir do sofrimento, sendo feliz como criança de galocha pisando em poça de água suja; e para desobstruir a alma dos sentimentos ruins.

Sabe, em dias como esse, quando o vazio torna-se meu conteúdo, entendo que estou feliz... e basta.

domingo, 14 de dezembro de 2008

Para ler com pressa.

por Stefano Manzolli.
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GENTE QUE NÃO SABE AMAR.
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"Nosso amor será eterno!", "Não sei viver sem você!", "Só você me faz feliz!"... quantas vezes não disse frases parecidas com essas ao pé do seu ouvido? Quantas e quantas vezes prometemos ficar lado a lado nos momentos difíceis?
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Ah!, como fui tão tolo de acreditar em... nós! Num futuro bonito e límpido... juntos! Depois de quatrocentos e trinta e dois dias de paixão, você pediu as contas, eu fechei a caderneta e nem sequer sobrou uma pontinha de Bento Santiago em mim.
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Depois de tanto tempo, estou decidido: não acredito mais em juras de amor. Também, não as faço mais - deixo que o amor seja demonstrado através dos carinhos, da falta de ar, do coração pulsando veloz e o brilho indissimulável nos olhos. Deixo o amor germinar lá dentro da alma e transparecer aos poucos em mim - por mim... assim, só assim, as palavras passam a não ter sentido para expressar esse nobre sentimento.
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Para ser bem franco, nós éramos imaturos e não sabíamos amar. Por isso, nosso amor era amor de palavras - frágil e vulnerável às tempestades de areia dessa vida. Numa delas, ele rompeu, morreu, tornou a ser pó debaixo dos tapetes persas de sua tia-avó.
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Ontem, por exemplo, quando nos encontramos na padaria, achei que não suportaria lhe ver com aquele seu novo namoradinho, mas... eu não senti nada. Na-da, nem uma vontade de estar no lugar dele, nem o desejo de ter o meu corpo abraçado ao seu.
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Você me viu primeiro, mas não cumprimentou calorosamente - nem eu. O papo foi padrão e nenhum dos dois se atreveu a perguntar nada além de como ia a vida e o trabalho. Despedi-me rápido (mentindo sobre estar atrasado para o café da manhã), você também não insistiu que eu ficasse. Enquanto partia, fez questão de não me acompanhar com os olhos - deixei por isso mesmo.
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Quando entrei no carro e vi, de longe, os seus lábios colarem aos dele, pude entender a maior das verdades: o amor acaba e os corações, antes aquecidos pelo sentimento frenético, ficam mais frios que fornada de pães franceses.
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Foto por Rapha Abreu