INFORMATIVOS:

1) Agora dá para ler as postagens do blog por Categoria. Basta clicar no tema do seu interesse no menu ao lado e gastar horas lendo bons textos. Caso queira, em Home poderá ler todos os posts sem nenhuma interrupção.

2) Os comentários estão liberados, agora! Caso você não tenha uma conta Google, comente na opção Anônimo, mas não se esqueça de assinar.

domingo, 4 de janeiro de 2009

Para ler com pressa.

Foto por Bruna Pimenta.


PEGADAS.

por Stefano Manzolli.


Corro, mas as pegadas permanecem logo atrás de mim. Não há tempo, distância ou velocidade que possa apagá-las. E o vento? Também não. O vento leva apenas a forma física do buraco na areia, porém a essência permanecerá para sempre.

A respiração está ofegante e os olhos nublam periodicamente... crio, nas imensas paredes rochosas, meus fantasmas de tempestade: a garrafa de uísque no chão, os olhos sombrios e estilhaçados, o corpo taciturno ao pé da escada, a árvore de Natal incendiada pelas luzes pisca-pisca.

Faz tempo que passou o Natal, até já entramos em um novo ano... a árvore, todavia, continuava na sala apenas por preguiça de desmontá-la. Talvez, não sei, era necessário que fosse testemunha - inanimada, velada, solene -, antes de tornar-se fuligem.

Agora, ela aparece um pouco desfigurada entre as fendas das pedras. As lágrimas não são suficientes para levá-la embora. Minha mente, frenética, ainda digere a idéia da fuga... "Não é fuga!" e a voz explode ao colidir com o ar. "Não é fuga!" e há vertigem na frase. "Fuga... fuga... fu...", a repetição amolece a idéia e torna-a mais fácil de ser compreendida... é fuga, quem sabe?

Fuga de mim mesmo, de um futuro que tentei não construir, de um clímax calculado e do épico envolto pelo manto da morte.

Chego à orla da praia. À frente, o mar - turvo, misterioso, entorpecente, convidativo. Atrás, as pegadas - fantasmas, estúpidas, eternas, cacos de vida. Sorrio... irônico da minha situação; chuto uma porção generosa de areia e cada grão reflete o sol - faz tempo que não olho para o céu. Hoje, está sem-graça: não há nuvens, assim como ontem à noite não havia estrelas. Entro na água, a qual engole meus pés... pernas... braços... depois, num momento sublime, percebo-me todo imergido e aprecio a idéia de não saber nadar.

É só uma questão de segundos para romper o meu cordão umbilical com a vida. Como sempre ouvi falar, as lembranças chegam (aos montes) e afundo cada vez mais - na água e na nostalgia. Falta o ar, chega a agonia de saber que não há volta... bato os braças e as pernas descompassadamente, engulo cada vez mais água. Vejo, em flashes, a noite passada e a covardia me empurra para baixo.

Começam os delírios.

Uma sereia, uns familiares, um ídolo da infância... um salva-vidas (um salva-vidas?) - nadando em minha direção, segurando meus braços, colocando minha cabeça para fora das ondas. Uma rajada de ar infla meus pulmões; respiro vagarosamente, sem motivos para voltar à realidade.

Estou vivo... se pudesse, escolheria a morte covarde - não posso mais. Resta-me o inevitável: uma nova chance de enfrentar as pegadas eternas da minha vida.

Um comentário:

João G. Viana/Pudim disse...

Mais um texto excelente...estou adorando esta seção, parabéns!