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quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

Através do espelho obscuro, capítulo 58


Foto: Guilherme Carnaúba

por Tuma

Ele cambaleava pela mansão, sem uma noção exata de onde estava ou o que fazia ali. Corpos se amontoavam a seu redor, todos vestidos exatamente da mesma maneira. O barulho dos tiros e dos gritos ainda soava em sua cabeça, e ele se lamentava por ter deixado a arma lá em cima e não poder enfiar uma bala na própria cabeça agora.

Ele tinha que... agora pensava melhor. Tinha que sair dali. Os policiais chegariam, cedo ou tarde, mesmo na tempestade, veriam aquele inferno, seria um inferno ainda maior. Precisava de um carro, isso, de um carro. Foi para a garagem.
Demorou para encontrar o lugar onde a garagem ficava. Entrou um pouco cauteloso, não havia ido até ali, alguém poderia estar se escondendo. Mas não havia nada. Somente várias fileiras de carros. Acendeu as luzes e os carros reluziram. Foi passando por cada um deles lentamente. As chaves estavam todas na ignição.

Apesar do luxo dos primeiros modelos, um carro em especial chamou sua atenção. Estava quase totalmente coberto, enfiado no fundo da garagem. Ele foi até lá e puxou de uma vez o pano. Era um carro bonito. Uma dessas caminhonetes que faziam sucesso quinze ou dezesseis anos atrás. Estava coberta de pó, mas o vermelho da lataria ainda estava bem visível. Curioso, ele olhou para a placa. Aquela caminhonete era de...

Imagine-se gritando em silêncio, por dentro. Imagine que alguém fez um buraco minúsculo na sua pele e por ele com um gancho está retirando todos os seus órgãos internos, para depois colocá-los de volta em ordem diferente.

O grito de João foi mais ou menos assim. Como naquelas vezes em que a gente dorme e, aparentemente depois de só piscar, já acorda, ele fechou os olhos quando um carro invadia a luz dos faróis do carro de Hartman e os abriu dentro de uma garagem desconhecida, ao lado de sua caminhonete roubada, assustado pelo acidente.

Mas, assim que acordou, viu enfiados dentro de sua cabeça, de uma só vez, numa fração de segundo, todo o medo, a perplexidade, a angústia, a curiosidade, o desespero, a dúvida, o tédio, a calma, a serenidade, o prazer, a frustração, o rejúbilo, o cansaço, a felicidade, a alegria, a impaciência, o ódio o amor e a dor que Ferdinando Peregrino Nápoles, o Tolo, sentira durante treze anos.

E ao mesmo tempo, toda a vida dele, João, voltava de uma só vez. Sua infância, adolescência, juventude... Ele agora se lembrava de tudo. Da tragédia da mãe, dos problemas com a irmã... lembrava-se, o mais doloroso, do que acontecera com seu pai. E tudo vinha, tudo voltava, de uma só vez, sem misericórdia.

João caiu no chão e começou a se arrastar, sentado mesmo, com as mãos se esfolando no piso de concreto, enquanto suas duas identidades se digladiavam, destruíam e reconstruíam, uma sobre a outra, uma enxertada na outra, uma sendo a outra. O choque o paralisou, finalmente, e de olhos arregalados, boca aberta e cabelos desgrenhados ele ficou ali durante vários minutos vendo suas duas vidas sendo repetidas diante de seus olhos.

Depois, deixou-se cair lentamente até o chão. Com a cabeça encostada no concreto, começou a chorar. Durante longos minutos, ele chorou, gemendo baixinho e deixando as lágrimas molharem o chão. Até que seus olhos secaram e a poeira começou a feri-las. Com grande esforço, então, ele se levantou e, quase se arrastando, foi até caminhonete.

Entrou na cabine e deu partida, mas o motor não pegou. Girou a chave de novo, e novamente o motor não pegou. Girou a chave mais uma vez e ficou segurando-a, até que, com um estrondo, o motor começou a funcionar. Um pouco desajeitado, ele manobrou na garagem e começou a se dirigir para fora.

Enquanto atravessava o caminho até o portão de saída, pensava em como poderia ter sido tão idiota de deixar a chave na ignição aquele dia em que ele fora roubado. Se ele não tivesse deixado a chave lá, o carro não teria sido roubado, ele não teria sofrido o acidente, nem perdido a memória. Mas agora era tarde demais. Tudo aquilo tinha acontecido, e agora ele estava aqui.

Ferdinando já resolvera todos os seus problemas, mas a João ainda restava um. Ele precisava voltar para casa.

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Um comentário:

João G. Viana/Pudim disse...

ARGHT!
Explodiu mesmo.
Até que não foi tão ruim.
O pior é limpar essa sujeira...
Poste o capítulo de amnhã bem cedinho :D