Foto: Bruna Pimenta
por Tuma
Saiu de casa na hora mágica, quando Miranda ainda está tomada por lusco-fusco e névoa, e o passado parece sussurrar pelas ruas. Acordou cedo, pegou suas coisas, a chave do carro, deu um beijo de despedida em Miranda e Sabine e saiu.
A cidade lhe parecia ainda mais secreta aquela amanhã. Observava as casas e as lojas e todas aquelas portas e janelas pareciam estar fechadas há séculos, ou mais: parecia que nunca haviam sido abertas. Ferdinando sabia que dentro de cada casa de Miranda se escondia um segredo, mas aquela espécie de epifania ancestral o deixou deprimido.
Rápido entrou na estrada, e a constante linha reta minou um pouco sua atenção. Seus olhos vagavam pelos arredores, e lhes pareceram familiares alguns trechos. Pegou-se pensando como era engraçado e estranho que nunca houvesse voltado àquela estrada desde o dia do acidente. Mas, afinal, toda sua vida em memória fora engraçada e estranha mesmo: não deu bola.
Passou por um posto moderno e bem construído, onde parou para abastecer, e poucos quilômetros à frente viu de relance um outro posto, velho e arruinado, além de levemente familiar. Pensou ser aquele em que supostamente parara no dia do acidente.
A partir daquele momento, ele começou a prestar mais atenção na estrada, como se buscasse encontrar ali algum fragmento de memória. Agora, ao invés de engraçado e estranho, achava idiota nunca ter ido até ali em busca de alguma lembrança. Essa sensação, porém, logo se desfez, pois além de um leve mal estar nada mais lhe veio à mente.
Após mais alguns minutos, chegou finalmente ao limite de município, e alguns quilômetros adiante entrava em Prospera. A cidade era claramente mais desenvolvida que Miranda, mas compartilhava com esta o peculiar aspecto ancestral e fechado, o semblante pouco hospitaleiro que com certeza contribuía para a solidão daquelas paragens.
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